Os dados mais recentes sobre o mercado de apostas mostram que o volume bruto de recursos destinados pela população às empresas do setor em 2024 superam e muito as projeções de referência usadas pelo Ministério da Fazenda tendo como base estudos de terceiros.
Integrantes da pasta vinham ressaltando que não tinham levantamentos próprios para mensurar o potencial e salientavam que os dados ainda não eram acurados, visto que o mercado é em grande parte uma novidade para o país.
Mas mencionavam informalmente até semana passada que os estudos, que indicavam uma grande variação de estimativas, apontavam para uma movimentação que poderia chegar a R$ 150 bilhões por ano.
O Banco Central identificou que o brasileiro destinou via Pix de forma bruta (isto é, sem descontar eventuais prêmios recebidos de volta) entre R$ 18 bilhões e R$ 21 bilhões mensais às empresas de apostas de janeiro a agosto —totalizando mais de R$ 166 bilhões.
Caso o mínimo mensal registrado até agora fosse observado no ano todo, o valor bruto (só com Pix) já ficaria em pelo menos R$ 216 bilhões. Considerando a média observada nos meses passados, o total chegaria a R$ 249 bilhões.
Ou seja, um patamar pelo menos 44% (ou R$ 66 bilhões) superior às estimativas observadas pela Fazenda. E ainda precisariam ser somados os pagamentos feitos por outros meios (como cartão ou TED, por exemplo), embora acredite-se que o Pix domine as transações.
Os valores não consideram o quanto pode ter retornado aos apostadores em jogos vitoriosos. O BC calcula que 15% do valor bruto fique retido com as empresas de apostas (sendo o restante distribuído a título de prêmios), mas afirma que o percentual pode estar subestimado.
Só entre usuários do Bolsa Família, o valor bruto destinado a apostas em agosto foi de R$ 3 bilhões, 20% dos cerca de R$ 14 bilhões pagos pelo Tesouro Nacional às famílias do programa social. O ministro Wellington Dias (Desenvolvimento Social) afirmou nesta quarta (25) que pediu mais informações à Fazenda.
“Certamente a situação das pessoas mais vulneráveis e outros aspectos sociais serão considerados quando da regulamentação [do mercado de apostas; na verdade já publicada e que continua em discussão]”, disse, em nota. “O Bolsa Família transfere um dinheiro livre para a família e tem por objetivo combater a fome e atender a necessidades básicas de pessoas em situação de insegurança alimentar e outras vulnerabilidades. Tudo faremos para manter estes objetivos”, afirmou.
A pasta via até semana passada as regras já publicadas como suficientes para regular o mercado, mas cresceu a preocupação com o tema no discurso de diferentes autoridades. O ministro Fernando Haddad (Fazenda), por exemplo, falou que os jogos viraram um problema social grave.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que houve uma piora na inadimplência que poderia ser explicada pela popularidade das bets. “Uma coisa que tem gerado preocupação na ponta é que o crescimento é muito grande”, disse.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que o endividamento dos mais pobres com apostas deve ser regulado. “Estamos percebendo no Brasil o endividamento das pessoas mais pobres tentando ganhar dinheiro, fazendo aposta. É um problema que vamos ter que regular, senão daqui a pouco vamos ter cassino funcionando dentro da cozinha de cada casa”, afirmou.
Cerco ao ‘jogo do tigrinho’
O Ministério da Fazenda se prepara para derrubar falsos “jogos do tigrinho” a partir de janeiro de 2025. A ideia é utilizar um certificado de legitimidade feito por empresas internacionais que atestariam o mecanismo de recompensa utilizado pelas plataformas de apostas.
O site que não receber o selo deverá ser retirado do ar no Brasil. O Fortune Tiger, site original do jogo e que opera regularmente em outros países, deve passar pelo crivo da Fazenda.
A intenção do ministério é fazer um pente-fino nas empresas do setor, separando companhias legitimas das plataformas que estão ligadas a fraudes e lavagem de dinheiro.
Além da Fazenda, devem integrar as discussões sobre a operação de limpeza a AGU (Advocacia-Geral da União), Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e a Polícia Federal.
Palavra PB