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Autoridades dos Estados Unidos estão preocupados de que a próxima recessão pode ser intensificada por uma série de cascata de falências na indústria hipotecária, causada por uma grande queda nos preços imobiliários, mercados congelados e aumento das inadimplências.
O Conselho de Supervisão de Estabilidade Financeira dos Estados Unidos (FSOC, na sigla em inglês), um órgão de alta técnica de reguladores financeiros criado depois da crise de 2008, soou o alarme na última sexta-feira (10) sobre uma crescente ala influente da indústria que escapou, na maioria, da fiscalização: as companhias hipotecárias não-bancárias.
Diferente dos bancos tradicionais, as hipotecárias não-bancárias são fortemente expostas para variações do mercado hipotecário, dependem de investimentos que podem secar em tempos de estresse e não possuem reservas estáveis para se apoiar em emergências. E, ao contrário dos bancos, essas empresas são pouco reguladas em nível nacional.
O FSOC alertou que essas vulnerabilidades únicas colocam em risco um efeito dominó numa crise futura, na qual várias companhias hipotecárias quebram, tomadores de empréstimos são bloqueados do mercado de hipotecas e o governo federal fica com os prejuízos.
“De forma simples, as vulnerabilidades das companhias hipotecárias não-bancárias podem amplificar os choques no mercado hipotecário e debilitar a estabilidade financeira”, disse a secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, que preside o FSOC, no relatório.
Reguladores federais estão pedindo para que os estados e o Congresso tomem atitudes a respeito dos riscos em questão, inclusive criando uma reserva financiada pela indústria para aliviar a pressão causada quando uma companhia hipotecária quebre.
Apesar do termo diferente, essas empresas tornaram-se players vitais que fazem a maioria das hipotecas nos EUA, atualmente. Elas incluem grandes marcas, como Rocket Mortgage, PennyMac e Mr. Cooper.
Até 2022, as companhias hipotecárias não-bancárias originaram cerca de dois terços das hipotecas norte-americanas e tinham os direitos de 54% dos saldos hipotecários, de acordo com o FSOC. Um crescimento significativo desde 2008.
De fato, servidores de hipotecas não-bancárias possuem os direitos de serviço de quase US$ 6,3 trilhões em saldos devedores em hipotecas seguradas por agências — representando 70% do total.
As companhias hipotecárias não-bancárias têm “vulnerabilidades” que podem ser responsáveis por “amplificar e transmitir o efeito de um choque para o mercado hipotecário e mais abrangente no sistema financeiro”, disse o órgão.
Por exemplo, se os preços de imóveis despencarem numa futura crise, empresas hipotecárias poderiam, simultaneamente, perder dinheiro e enfrentar crises de caixa que dificultaria com que elas pedissem aportes para investidores em nome de tomadores apertados, o FSOC afirmou.
Esses desafios seriam exacerbados pelas relativamente grandes quantidades de dívidas que essas companhias possuem.
Essa pressão nas companhias hipotecárias não-bancárias prejudicaria, então, tomadores de empréstimos procurando hipotecas e poderia forçar o governo federal a assumir as obrigações, de acordo com reguladores.
Pleito por ação
Yellen e seus colegas cobraram, na última sexta-feira, reguladores estaduais para melhorar os requerimentos e padrões das companhias hipotecárias, incluindo como elas poderiam ser liquidadas em segurança numa crise.
Para endereçar a pressão por liquidez durante um tempo de estresse, reguladores pediram ao Congresso para considerar uma legislação que forneça novas autoridades para a Associação Nacional Hipotecária do Governo expandir um programa de apoio assistencial.
Além disso, reguladores afirmaram que o Congresso deveria considerar estabelecer um fundo — financiado pelas companhias hipotecárias não-bancárias — para “prover liquidez aos servidores de hipotecárias não-bancárias que estão insolventes ou que alcançaram um ponto de falência”.
Em resposta, a Associação de Hipotecas Bancárias (MBA), um grupo industrial de trade, afirmou que suporta os objetivos do FSOC por um “mercado de serviços financeiros estável e sustentável”, mas descreveu algumas das recomendações como “desnecessárias”.
“Anos de um tratamento de capital punitivo e regulatório já limitou a determinação e habilidade de instituições de depósito de participar nos mercados de empréstimo de hipotecas e serviços”, Bob Broeksmit, presidente e CEO da MBA, disse em uma declaração na sexta-feira.
“Enquanto nós apoiamos padrões nacionais para requerimentos de liquidez e capital, colocar camadas de requerimentos de supervisão dupla ou entidades supervisoras em um mercado fortemente regulado vai adicionar um custo e uma complexidade significativa”.
A MBA alertou que realizar essas mudanças poderia reduzir a competição e aumentar custos de empréstimo.
Scott Olsen, diretor-executivo da entidade Credores Residenciais Comunitários da América (CHLA), outro grupo de trade, disse que o relatório da FSOC não indica um risco significativo para o pagador de impostos, somente um risco limitado ao sistema financeiro como um todo.
“Dado os atuais desafios de possuir o próprio imóvel, a CHLA espera que os reguladores não exagerem sobre esse risco limitado com regulações e tarifas que restringem o acesso à hipotecas ao crédito”, Olsen afirmou em uma declaração.
Até alguns reguladores têm preocupações sobre o novo plano do FSOC.
Brandon Milhorn, presidente e CEO da Conferência de Supervisores de Banco Estatais, alertou em uma declaração na última sexta-feira que a recomendação para estabelecer um novo fundo de liquidez é “prematuro no melhor dos casos”.
“Antes de considerar qualquer proposta, o Congresso deveria demandar uma pesquisa e análise muito maior a respeito das potencialmente dramáticas e não intencionais consequências dessa recomendação”, disse Milhorn.
“Eu estou preocupado que essa recomendação poderia impactar negativamente o mercado de hipotecas não-bancárias, particularmente para tomadores de empréstimo de baixa e média renda, grupos minoritários, compradores de imóveis pela primeira vez e veteranos”.
Entretanto, Patricia McCoy, professora da Escola de Direito da Faculdade de Boston, atentou que a confiança das companhias hipotecárias não-bancárias em empréstimo de curto prazo para financiamentos “os torna vulneráveis a colapsar”, se as taxas de empréstimo crescerem ou os empréstimos diminuírem.
“Firmas de hipotecas não-bancárias são finamente capitalizadas, o que as torna vulneráveis ao fracasso se perderem financiamentos ou se as inadimplências hipotecárias aumentarem”, disse McCoy, uma ex-reguladora de hipotecas.
“Iniciando no começo de 2007, nós vimos um tsunami de firmas de hipotecas não-bancárias quebrando precisamente por essas razões”.
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